Marcelo Stein de Lima Sousa
DALIC / UTFPR, Curitiba
Abril de 2021
A Vergonha de um Professor
Marcelo Stein de Lima Sousa
DALIC / UTFPR, Curitiba
Abril de 2021
Curso de Extensão / GOPP-UTFPR
Desafios do Presente e do Futuro: Comunicação, Globalização e Tecnologia
Sobre o Futuro da Docência: Mentalidades e Tecnologia
As imagens que nos chegam são tristes
"Algo assim parece acontecer: primeiro os despossuídos não têm voz alguma. Quando eles começam a criar uma voz, eles são ridicularizados. Então (não tenho certeza da ordem), eles são informados de que estão errados ou que isso era algo que todos sabiam o tempo todo. Então, eles são informados de que são um perigo. Finalmente, de uma forma muito parcial, pode ser que suas vozes sejam ouvidas e levadas a sério. E foi uma luta o tempo todo." (John Law 1991 Introduction: monsters, machines and sociotechnical relations. In: A Sociology of Monsters, p. 2)
Este novo tipo de situação não é induzido por uma ação, nem pode ser resolvido com uma ação. Em vez disso, "faz-nos agarrar, é suposto que nos faça agarrar, algo intolerável e insuportável" (Deleuze, 1989, 18), a vida no fio da navalha. Este algo intolerável não é uma questão de violência bruta ou terror, mas sim 'algo muito poderoso ou muito injusto, mas às vezes também muito bonito'. (Buchanan & McCormack, 2018)
Eu dizia ao aluno que ninguém sabe do que nosso corpo é capaz
Meu corpo afeta e é afetado
...que a servidão é um estado onde o desempoderamento se torna significativo e recompensador, ao invés de intolerável
Para afastar a tristeza, devemos cultivar uma disposição para uma vida alegre
A servidão é odiosa porque nos faz acreditar que o intolerável é normal
Que o filósofo é aquele que grita diante do intolerável para poder pensar e criar um conceito que modifique esta imagem de pensamento...
A violência a que sou exposto cotidianamente me faz pensar, algo problemático está nestas imagens...
Que minha indignação contada à distância aos amigos e, ao mesmo tempo, para as paredes do apartamento, pode ser uma maneira de colocar pra fora, de urrar
O primeira função destas comparações é estabelecer de que forma os números levantados podem 'provar' a existência de um mundo ordenado segundo uma ótica bastante específica.
O neoliberalismo recruta a sociedade civil para 'juntar evidências' deste ordenamento. Estas evidências promovem a competição de todos contra todos, de todo tipo, a todo momento, em qualquer lugar.
A principal característica desta versão do Capitalismo que causa impacto na vida dos professores é a obsessiva compulsão em medir e quantificar tudo o que for possível para efeito de cálculos.
Qual tipo de cálculo? Todo aquele que possa ser auditado. Vivemos em uma cultura de auditoria, onde o que interessa são resultados (mensuráveis) que possam ser comparados.
Governar, segundo Foucault, significa cuidar de condutas. Através de uma mistura de tecnologias e políticas (no sentido de políticas públicas), o governo trabalha para garantir uma maneira de se pensar a composição de uma sociedade.
Governar, no caso da educação, significa cuidar das condutas de todos os envolvidos... Através de perfis, rankings, classificações benchmarks e outras ordenações, uma universidade cria 'um mundo inteiro' na ponta de um lápis...
Uma tecnologia atual para cuidar da conduta está associada à produção digital de rastros de cada indivíduo. Sem direito à privacidade, cada competidor fornece os próprios vestígios para ser monitorado. Isto é chamado de self-tracking.
O foco na coleta e na análise de dados a partir de uma diversidade de fontes de informação com o intuito de fornecer informações sobre o que funciona (ou não) em relação ao aprendizado ou ao ensino
é similar ao que está acontecendo em outras áreas. Marketing, planejamento urbano, saúde pública, ou transporte urbano estão todos se 'beneficiando' de algum tipo de analítica.
No caso do professor, tudo se resume à sua conduta: o único profissional capaz de ensinar a resistir à solidão da competição é quantificado, isolado, colocado em quarentena.
A esperteza deste 'governo algorítmico' é, como afirma, Antoinette Rouvroy, mudar o mundo sem mudar nada. Basta mudar a forma como representamos o mundo. Através dos big data e seus algoritmos, criamos perfis.
Na mídia, os professores estão sendo 'caçados'. O Senado está discutindo leis para perseguir aqueles professores que 'saiam da linha'. Mas nas campanhas de marketing, os professores 'estão em alta'...
Basicamente, que os dados não são jamais dados.
A grande questão, posta para os professores, é de como re-existir, como reinventar uma profissão que, é claro, não pode ser calculada.
Meu perfil pode ser algorítmicamente calculado, mas não estou sózinho.
John Marks, 'Deleuze: Writing in terror'
"As forças que causam o grito, diz Deleuze, não devem ser confundidas com o espetáculo visível diante do qual se grita. O grito captura forças invisíveis, que não podem ser representadas, porque estão além da dor e do sentimento: elas são, afirma Deleuze enigmaticamente, as 'forças do futuro', forças virtuais. Ao decidir pintar o grito, Francis Bacon é como um lutador confrontando os ‘poderes do invisível’, estabelecendo um combate que antes não era possível. Ele permite que a vida grite com a morte, confrontando o terror e entrando em combate com ele..."
DALIC / UTFPR
stein@utfpr.edu.br
https://slides.com/msteinas/vergonha-professor